Moratórias chegam ao fim nesta quinta-feira. Deco denuncia casos de famílias que preveem dificuldades para retomar pagamentos mas não receberam qualquer proposta dos bancos para solucionar o problema.

Deco afirma que muitas famílias que adivinham dificuldades para retomar o pagamentos das prestações dos empréstimos não foram contactadas pelos bancos.

A coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Associação de Defesa do Consumidor afirma que sobretudo desde agosto tem recebido contactos de famílias “que sabem que vão ter dificuldades em retomar o pagamento das prestações a partir de outubro”, e que “muitas destas famílias não receberam qualquer proposta das instituições de crédito”. Natália Nunes conclui que “não tendo qualquer proposta, o risco de incumprimento é muito grande”.

Os bancos tinham até ao final de agosto para avaliar a capacidade das famílias para retomarem os pagamentos dos empréstimos e, nos casos em que fossem previsíveis dificuldades, apresentar-lhes propostas de solução até meio de setembro.

Mas Natália Nunes afirma que tem sido contactada por famílias que não receberam qualquer proposta, “possivelmente porque a instituição financeira entendeu que elas não tinham capacidade financeira para pagar qualquer prestação. São famílias que infelizmente podem vir a ser confrontadas com uma situação de incumprimento”.

A coordenadora afirma ainda que nos casos em que os consumidores recebem propostas dos bancos, elas têm passado sobretudo pela negociação de períodos de carência “de seis a doze meses”, o que não é uma solução universal. A responsável da Deco lamenta ainda que em muitos casos os bancos não transmitem toda a informação: “O consumidor não é informado sobre o valor que vai pagar durante o período de carência nem sobre o valor da prestação após a carência.”

Natália Nunes alerta ainda que, ao contrário do que aconteceu durante as moratórias, “as renegociações de crédito em curso podem vir a ser transmitidas à Central de Responsabilidades de Crédito, o que pode ter consequências em renegociações futuras daquele ou de outros créditos do consumidor”.

As famílias que entrem em incumprimento têm proteção durante 90 dias: os bancos não podem, até ao final do ano, executar as hipotecas de quem esteve em moratória. Mas Natália Nunes alerta que essa é uma “proteção muito fraca, porque se uma família não tem agora uma solução com o banco, não será mais fácil encontrar essa solução em janeiro”.

Para as famílias que prevejam dificuldades para voltar a pagar prestações, a Deco repete a mensagem: “contactem as instituições de crédito para que se encontrem soluções que podem passar por aumentar prazos dos empréstimos, negociar períodos de carência, ou outras. Há várias soluções possíveis, atendendo à situação específica de cada família e à causa das dificuldades e que podem contribuir para que aquela família não entre em incumprimento. Uma família que entre em incumprimento num crédito à habitação já sabe que pode vir a ser confrontada com uma ação em tribunal que levará à perda de bens, rendimentos e da casa”.

Medida inédita chega ao fim ano e meio depois

Dezoito meses depois de terem sido criadas, as moratórias dos créditos bancários chegam quase todas ao fim nesta quinta-feira, forçando famílias e empresas a retomarem o pagamento dos empréstimos.

Os últimos números do Banco de Portugal (BdP) indicam que a medida afeta 243 mil famílias. Destas, a vasta maioria – 230 mil – tem crédito à habitação, no valor total de 14,4 mil milhões de euros.

No lado das empresas, o valor combinado dos empréstimos sob moratória atingia, em julho, 21,8 mil milhões de euros. Destes, mais de um terço (8,4 mil milhões de euros) eram créditos de quase 24 mil empresas de setores mais afetados pela pandemia.

O regime das moratórias públicas foi criado no final de março, duas semanas após o início da pandemia. Logo depois, os bancos privados avançaram com as suas próprias versões das moratórias, permitindo aos clientes escolherem o regime (público ou privado) que lhes seja mais vantajoso.

Há moratórias que só terminam no final do ano: em março foi reaberta a adesão à medida, com uma duração máxima de nove meses que termina em dezembro, mas pelas contas da Deco, estes empréstimos deverão ser residuais: “o grosso dos casos termina hoje”, afirma Natália Nunes.

As empresas (exceto as dos setores mais abalados pela pandemia, como a restauração e hotelaria) voltaram a pagar juros desde abril.

Para estas empresas, as mais afetadas pela crise, o governo criou entretanto uma almofada de mil milhões de euros para amortecer o impacto da retoma do pagamento das prestações: uma garantia estatal que pode atingir um máximo de 25% sobre cada crédito em moratória que for reestruturado, num teto de 10 milhões de euros.