Um juiz de instrução criminal no Tribunal de Braga decidiu levar a julgamento pelo crime de subtração de menores uma mulher de Barcelos que “fugiu” com a filha para Espanha após a guarda da criança ser confiada ao pai.
Odespacho de pronúncia, datado de 15 de março e a que a Lusa hoje teve acesso, o juiz iliba a avó da criança, que o Ministério Público (MP) também tinha constituído arguida no processo, decretando a sua imediata restituição à liberdade.
A mãe, que levou em 2011 levou a menor para Barcelona, em Espanha, também estava em prisão preventiva e foi igualmente libertada, ficando sujeita a termo de identidade e residência, a mais leve das medidas de coação, enquanto aguarda pelo julgamento.
A mãe da menor, de 57 anos, e a avó, de 81, foram detidas em janeiro de 2021 pela GNR na Figueira da Foz, tendo estado desde então em prisão preventiva.
As duas estavam acusadas pelo MP de um crime de maus-tratos e de um crime de sequestro agravado, em concurso aparente com um crime de subtração de menores.
As arguidas requereram abertura de instrução, tendo agora o juiz decidido levar a julgamento apenas a mãe e só por um crime de subtração de menores.
O caso remonta a fevereiro de 2011, quando o Tribunal de Barcelos decidiu alterar o regime do exercício do poder paternal relativo à menor, determinando que a mesma fosse confiada à guarda e cuidados do pai.
A mãe não se conformou e “tudo fez” para não entregar a filha ao pai, segundo o processo.
Chegou a marcar uma data para entregar a criança, tendo o pai pedido a uma irmã que a fosse buscar a casa, em Carvalhas, Barcelos.
No dia marcado, o acesso à habitação estava “bloqueado” pelos habitantes da freguesia, pelo que a irmã do pai da menina nem sequer conseguiu aceder à porta da casa.
No local, estava também a comunicação social, tendo a mãe da criança dito perante todos os presentes que o tribunal ia entregar a filha ao pai, “apesar de este ter abusado sexualmente” dela.
Desta forma, a mãe incitou a população à revolta e criou um ambiente de tensão, inviabilizando a entrega da criança.
Chegou a haver uma “vigília” popular à porta de casa, tendo entretanto a mãe impedido a filha, então com sete anos, de ir à escola, para não ser “apanhada” pelo pai.
No dia 01 de março de 2011, o tribunal ordenou a entrega coerciva da criança ao pai, mas a mãe já tinha fugido com ela para Barcelona, em Espanha, tendo ambas ali vivido até ao verão de 2018.
Regressaram então a Portugal, tendo passado a viver na Figueira da Foz, onde a mãe e a avó da criança foram detidas, em janeiro deste ano.
A acusação do MP foi deduzida em 2020, um facto criticado pelo juiz de instrução criminal, uma vez que a fuga tinha ocorrido em 2011 e que, desde então, o MP “nada mais soube” sobre o caso, nem sequer sobre o paradeiro da criança.
O juiz criticou o teor da acusação, a investigação e os crimes de sequestro e maus-tratos que foram imputados às arguidas.
Sublinhou que, uma vez em Espanha, a criança fez uma vida “completamente normal”, já que andava na escola, tinha amigos, estava integrada, aprendeu e falava a língua.
Além disso, quando regressou a Portugal, continuou a frequentar normalmente a escola, na Figueira da Foz.
“Apenas o MP não o descobriu”, lê-se no despacho de pronúncia.
Quanto à avó da criança, o juiz considera que não há quaisquer provas do seu envolvimento nos factos.
Restou, a pronúncia da mãe por subtração de menor, um crime punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.
O juiz sublinha que a mãe tinha uma vida profissional estabilizada e uma família alargada, pelo que fica por perceber “a razão para tudo abandonar, pegar na filha e começar uma vida nova num país estrangeiro”.
Atualmente com 17 anos, a filha já relatou, ao tribunal, o “profundo sentimento de amor” que tem pela mãe, a quem chama heroína, adiantando ainda que “não quer ter qualquer relação” com o pai.