O arranque do ano fica marcado por boas notícias para as finanças públicas portuguesas, com o Estado a alcançar um excedente orçamental no primeiro trimestre, impulsionado pelo desempenho da atividade económica, segundo os economistas consultados pela Lusa.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) divulga esta sexta-feira o saldo orçamental, em contas nacionais, dos primeiros três meses deste ano, depois do país ter fechado 2022 com um défice de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB), um resultado melhor do que o previsto.
Os economistas consultados pela Lusa consideram que os dados disponíveis, nomeadamente os resultados da execução orçamental, permitem antever um excedente no primeiro trimestre.
“Em contabilidade pública, o saldo orçamental do 1.º trimestre foi de 4.899 milhões de euros (2,0% do PIB), um valor muito favorável, que deverá ser superior ao valor em contabilidade nacional”, refere o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, Pedro Braz Teixeira.
A influenciar o resultado está, segundo o coordenador do Católica-Lisbon Forecasting Lab, João Borges de Assunção, a inflação, “já que a subida das receitas, particularmente as relativas ao IVA, é superior aos aumentos dos salários e pensões, que são as principais despesas do Estado”.
Pedro Braz Teixeira destaca que a receita fiscal subiu 6,5%, “muito acima do orçamentado (2,7%)”, enquanto as contribuições para a segurança social subiram mais (11,7%), também muito acima do planeado (3,6%).
Como fator de força esteve também evolução da despesa corrente, “que cresceu apenas 2,1% face aos 5,3% programados para o conjunto do ano, com uma grande ajuda da queda (necessariamente temporária) de 21,6% nos juros”, assinala o economista.
“Infelizmente, há também um grande atraso na execução do investimento público, a crescer apenas 6,7% face aos 45,2% programados, com destaque para a falta de investimento no SNS, em que ainda só se investiu 3,8% do planeado para o conjunto do ano”, refere.
Ainda assim, João Borges de Assunção alerta que o efeito positivo da inflação no saldo orçamental anual é temporário, considerando que se deverá dissipar quando a taxa regressar ao objetivo do Banco Central Europeu (BCE).
“Daí a preocupação em que não se aumente a despesa rígida do Estado, em resultado deste efeito positivo de curto prazo da inflação nas contas públicas”, explica.
Enquanto Pedro Braz Teixeira acredita que o resultado alcançado no primeiro trimestre “significa pouco para o resto do ano” – porque “há uma forte sazonalidade nas contas públicas, parte da qual é arbitrária, já que muitas verbas são cativadas inicialmente pelo Ministério das Finanças, para só irem sendo libertadas em função da execução orçamental ao longo do ano” e “porque o PIB teve um crescimento excecional e irrepetível” -, João Borges de Assunção mostra-se mais otimista.
“O défice orçamental no conjunto do ano pode ficar dentro do previsto no Orçamento do Estado (0,4% do PIB nominal), apesar do aumento extraordinário das pensões que não constavam do documento original”, considera, recordando que, por exemplo, o Banco de Portugal prevê um défice de 0,1%.
Apesar de mais pessimista, o economista do Fórum para a Competitividade acredita que “é agora mais fácil atingir a meta orçamental de 2023”, mas defende que “não é aceitável que isso seja alcançado à custa do investimento público, sobretudo à custa do investimento público na saúde”.
Na totalidade do ano de 2022, o défice orçamental caiu para 0,4% do PIB, meta que o Governo prevê também este ano alcançar.
Com as contas nacionais por setores institucionais, o INE divulga ainda a taxa de poupança das famílias, que João Borges de Assunção recorda ter sido de 6,1% no quarto trimestre de 2022.
“O bom desempenho do PIB no primeiro trimestre foi acompanhado de um crescimento frágil do consumo privado, de apenas 0,4%. Se isso for acompanhado de uma descida adicional da taxa de poupança pode sinalizar que a evolução do consumo das famílias não é suportável pelos acréscimos de rendimento disponível”, adverte.
Para o economista da Católica, “a prazo algo terá de ceder: o consumo privado ou a poupança”.