A psicóloga Catarina Lucas explica qual a razão que poderá justificar o baixo número de casamentos em Portugal.
A tradição dos casamentos já não é o que era. O número de solteiros em pleno século XXI é cada vez maior. De acordo com os dados dos Censos 2021, publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, há cada vez menos casamentos em Portugal. Cerca de 43,5% dos portugueses estão solteiros (4,5 milhões de solteiros contra 4,2 milhões de casados).
No seu livro ‘Vida a Dois (Um olhar sobre o casal, as relações e a sexualidade)’, publicado em 2020, a psicóloga Catarina Lucas afirma que “o casamento passou de moda”. As múltiplas expressões referentes ao casamento que a psicóloga vai ouvindo em consultório são que é algo que ‘não faz sentido’, que ‘não muda nada’, que ‘um papel não acrescenta valor’, que ‘não é importante’ e que ‘nunca foi um sonho’.
No entanto, um olhar mais atento a estas referências revela que talvez as coisas não sejam bem assim e que este ainda é o sonho de muitos. “Contudo, por razões diversas, parece cada vez mais difícil de verbalizar e de assumir, sobretudo quando o outro lança a deixa de não querer casar. A sensação é de que as pessoas querem esconder de si próprias o desejo do casamento, pois o assumir dessa vontade pode revelar um papel de fragilidade, que parece cada vez mais ecoar numa sociedade que se quer independente”, pode ler-se em comunicado. “Mas a verdade é que o ‘não querer casar’ soa, em muitos casos, a um mecanismo de proteção e a uma estratégia de manutenção do amor próprio ou do orgulho, uma vez que ninguém deseja assumir que quer casar e ouvir do cônjuge ‘mas eu não quero’ – algo que pode soar a rejeição e a um ‘ele(a) não quer casar comigo’.”
A falta de tolerância, elevados padrões para futuros parceiros, os problemas económicos, as dificuldades em manter um trabalho estável e uma casa própria e os elevados custos de um casamento, bem como do processo de separação, são fatores que também contribuem para que cada vez menos casais culminem no matrimónio. Contudo, ao mesmo tempo que surge a necessidade de partilhar a vida com alguém, “parece surgir também o receio do compromisso e da conotação ‘para sempre’. Com a sociedade em mudança, o homem já não procura uma mulher que cuide dele, do mesmo modo que a mulher já não procura um homem que garanta a subsistência da família. Estarão estas mudanças e necessidades de ajustamento a interferir com a capacidade de comprometimento com as relações e com o amor?”, continua.
A verdade é que “este ainda existe, mas encontra-se camuflado por necessidades diferentes que outrora motivaram casamentos”. O conselho da psicóloga Catarina Lucas, que muitas vezes recebe em consultório diversos casais com problemas na relação devido à questão do casamento, é que se “dedique tempo em casal para conversar abertamente sobre o assunto, pois o que não é falado acaba por se transformar em mágoa”.
A psicóloga reforça que “é normal existirem divergências entre o casal, mas que será sempre necessário ceder e abdicar de algumas coisas inerentes ao relacionamento, seja no que respeita ao casamento ou a qualquer outra questão no âmbito do casal”. “Revela-se importante mostrar ao outro os valores pelos quais o parceiro se rege e fazê-lo desde cedo, para que o outro saiba aquilo que pode esperar. Se o parceiro tem o sonho de casar, não convém dizer apenas passados dez anos de relação que, afinal, talvez não seja o que pretende”, remata.