Fugiu do Irão por ser fotografada nua e acabou sem-abrigo

Ser fotógrafo ou modelo na República Islâmica do Irão é sinónimo de ser vigiado. E detido. Mormente quando se quebram regras, como fez Negzzia – é um pseudónimo, para proteção.

Num país onde a nudez da mulher é um tema absolutamente tabu, ela fez-se fotografar desnudada. Teve de fugir. Foi descoberta em Paris, sem-abrigo.

Uma das detenções rotineiras da “Polícia dos costumes” iraniana envolveu o fotógrafo que a retratara nua. Era 2017. O homem, que Negzzia acusara de tentar violá-la numa sessão fotográfica, denunciou a existência dos retratos. E ela sabia que, se fossem conhecidos, iria, no mínimo, acabar na prisão e ser castigada com chicotadas.

Negzzia decidiu então fugir para Istambul, na Turquia, onde arranjou trabalho. Voltou a ter de fugir à Polícia depois de uma mulher, que a mordera por o marido ter olhado para ela, a acusar de agressão.

Um dia, ao ouvir “Ne me quitte pas”, a canção de Jacques Brel que adora desde a infância, a iraniana decidiu onde queria estabelecer-se: Paris. Um amigo propôs ajudá-la pondo-a em contacto com uma agência de modelos na capital francesa e prometendo encontrar-lhe um apartamento. Em troca, pediu-lhe compensações de natureza sexuais. Negzzia recusou e foi sozinha. Aterrou em Paris em outubro do ano passado.

Semanas de calvário

Ainda não sabe como, um segurança deixou-a assistir a um desfile na cidade. E Negzzia anteviu o futuro e resolveu pedir asilo. Os documentos deram entrada no dia 13 de novembro de 2018. Entretanto, gastara o nada que tinha em hotéis. Começa, em pleno inverno, a vida de sem-abrigo.

Durante semanas, dormiu em bancos, com outros sem-abrigo que lhe emprestavam mantas, passava dias em esplanadas aquecidas e com wifi para alimentar a conta no Instragram, a única coisa que ainda a ligava à vida de modelo, descansava em parques de estacionamento. Um dia vendeu um saco cheio de vestidos por dez euros para poder comer.

Aos poucos, juntou os 6,80€ diários do apoio que recebia enquanto aguardava a resposta ao pedido de asilo e inscreveu-se num ginásio. Mal alimentada, apelidava-se de “zombie”. Um dia, adormeceu numa das máquinas e despertou os amigos com quem treinava para o seu estado. Arranjaram-lhe um alojamento provisório.

A história da iraniana começou a espalhar-se até que chegou aos ouvidos de um advogado de origem iraniana, Sahand Saber, para quem Negzzia representa “a multitude de iranianos que mostram que o povo está longe dos slogans extremistas dos seus dirigentes”. Graças a ele, Negzzia recebeu no dia 7 a aceitação do pedido de asilo, depois de até o ministro do Interior francês abordar o caso. Depois de semanas na rua, está legal. E livre.