Teletrabalho. Empregadores não têm de assumir “todas e quaisquer despesas”, diz PS. Propostas seguem para a especialidade sem votação

Durante o debate, a oposição foi unânime ao acusar o PS e Governo de defenderem caminhos diferentes para o teletrabalho. Pagamento de despesas aos profissionais foi o ponto mais crítico da discussão. “Esta bancada não acha que, só por ir para casa em teletrabalho, a empresa tenha de assumir todas e quaisquer despesas”, afirmou a líder parlamentar do PS

Todos os projetos de lei sobre o teletrabalho que estiveram esta quarta-feira em discussão no Parlamento baixaram à comissão, sem votação, para serem discutidos na especialidade. Durante o debate – que partiu de um agendamento potestativo do BE, – a oposição foi unânime ao acusar o PS e Governo de defenderem caminhos diferentes para o teletrabalho.

Como o Expresso tinha avançado, as propostas de diploma eram convergentes da identificação das matérias a contemplar numa revisão legislativa, mas divergentes nas soluções apresentadas. Essa clivagem ficou ainda mais presente num debate parlamentar em que o BE, que pediu o agendamento da discussão, se distanciou dos projetos de lei do PS e do PSD, aproximando-se das soluções propostas pelo PAN, PCP e PEV num dos pontos mais críticos da discussão, o pagamento de despesas aos profissionais em teletrabalho.

No arranque do debate, o deputado José Soeiro começou por afirmar que a iniciativa do partido teve o “mérito” de fazer com que PS, PSD, PCP, CDS-PP, PAN e PEV apresentassem propostas sobre o tema, admitindo esperar que seja o “pontapé de saída” para um processo legislativo que procure na especialidade “maior proteção”, assim como o respeito pela “privacidade” dos trabalhadores.

Realçando as “virtudes” do projeto do bloco, José Soeiro vincou desde logo a “clivagem” entre a proposta do partido, assim como a do PCP, PEV e PAN face às iniciativas do PS e do PSD que “não preveem a obrigatoriedade da compensação aos trabalhadores” e que as normas sejam imperativas.

Apontando para a proposta socialista, o deputado bloquista ironizou, considerando que tem a “proeza” de regulamentar o teletrabalho sem introduzir alterações no Código do Trabalho, ao mesmo tempo que é “extremamente perigosa” ao criar, por exemplo, o conceito de “tempo de contacto”. “É uma armadilha arriscadíssima pela qual não devemos embarcar”, disse, perentório.

Aliás, toda a oposição foi unânime ao acusar o PS e o Governo de defenderem “caminhos diferentes” para o teletrabalho. Do lado do PSD, a deputada Lina Lopes disse que as diferentes posturas do Partido Socialista e do Executivo condicionam todo o processo sobre o tema. “O PS consegue ter a proeza de se sentar em três cadeiras, na Assembleia da República, na concertação social quando discute com as confederações patronais e sindicais e no quotidiano com reflexões profundas sobre o mesmo tema no Livro Verde”, ironizou a deputada social-democrata.about:blank

Também Inês de Sousa Real, líder parlamentar do PAN, argumentou no mesmo sentido, exigindo esclarecimentos ao grupo parlamentar socialista: “Parece que há um PS a dois ritmos: o da Assembleia da República e o PS do Governo. No Livro Verde do futuro do trabalho defende o alargamento a trabalhadores com doenças crónicas ou deficiência, por isso pergunto se o PS vai acompanhar esta iniciativa ou ficar aquém do próprio Governo e de uma medida da maior justiça”, questionou.

“NÃO HÁ VÁRIOS PS”, DIZ ANA CATARINA MENDES

Do lado do PS, Ana Catarina Mendes negou que existam posicionamentos diferentes entre o Partido Socialista e o Governo relativamente ao teletrabalho, saindo ainda em defesa da discussão em sede de concertação social. “Não há vários PS, há o PS que por acaso ganhou as eleições, está na bancada do Governo e que trabalha em conjunto. O que está em discussão em concertação social em nada belisca o que está hoje a ser discutido e o Livro Verde sobre as relações laborais e a matéria do teletrabalho. Para o PS, o diálogo social e a concertação social são sempre para respeitar”, assegurou.

Já em resposta ao Bloco, que criticou o facto de a proposta do PS não prever a obrigatoriedade do pagamento de despesas ao trabalhador em regime de teletrabalho, a líder parlamentar socialista reafirmou que a sua “bancada não acha que, só por ir para casa em teletrabalho, a empresa tenha de assumir todas e quaisquer despesas”.

A deputada do PCP, Diana Ferreira, criticou, por sua vez, aquilo que considera ser o “endeusamento” do teletrabalho, frisando que são omitidas as consequências negativas para os trabalhadores no regime de trabalho à distância. “A promoção do teletrabalho como panaceia para todos os males é algo que o PCP rejeita”, insistiu.

Do lado do CDS, o deputado Pedro Morais Soares fez questão de recordar que o partido apresentara há cinco anos uma proposta sobre teletrabalho que contou com a oposição do PS e do BE. “Já poderia estar tudo regulamentado. Este é um assunto sério que exige um debate rigoroso”, observou.

PAGAMENTO DE DESPESAS DIVIDE PARTIDOS

O pagamento de despesas aos profissionais em teletrabalho, que tem sido um dos pontos mais polémicos do debate, deixa bem evidentes as divergências entre os partidos. A esmagadora maioria dos projetos apresentados considera necessário clarificar esta questão. Mas enquanto PS e PSD defendem que a comparticipação devida aos trabalhadores por acréscimo de custos com o teletrabalho deve ser definida por acordo entre patrão e trabalhador ou em sede de negociação coletiva, PCP, BE e PAN querem ver o tema clarificado na lei. E em algumas propostas, como as do PCP e do PAN, é mesmo definido um valor ou fórmula de cálculo para a compensação a atribuir, cerca de 11 euros por cada dia de teletrabalho. O PAN acrescenta ainda à proposta outra variável: da lei deve constar que o empregador está também obrigado a reembolsar as despesas com aquisição e instalação de instrumentos de trabalho, num limite não superior a três vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais, €1316,43.