Iniciativas do Bloco de Esquerda e de um grupo de cidadãos foram chumbadas pela maioria dos partidos. Proposta visava proteger os direitos dos trabalhadores e promover o comércio tradicional.
A Assembleia da República rejeitou, esta quinta-feira, as propostas que visavam o encerramento das grandes superfícies comerciais aos domingos e feriados, bem como a limitação do horário de funcionamento destes estabelecimentos até às 22h00. A medida foi proposta por um grupo de cidadãos e também pelo Bloco de Esquerda, mas acabou por ser chumbada com os votos contra do PSD, CDS, Chega, PS e Iniciativa Liberal (IL).
A proposta popular, subscrita por mais de 23 mil cidadãos, defendia uma reorganização do regime de funcionamento do comércio, com o objetivo de assegurar melhores condições laborais para os trabalhadores e revitalizar o comércio tradicional. Apesar de não ter sido ainda realizada a votação final — agendada para sexta-feira —, o debate parlamentar revelou já uma maioria parlamentar contrária à medida.
O Bloco de Esquerda, que apresentou um projeto de lei alinhado com esta proposta, incluiu uma exceção para cinemas e estabelecimentos de restauração, tentando responder a críticas sobre o impacto no lazer e na vida cultural.
Durante o debate, a deputada Mariana Mortágua (BE) criticou os horários desregulados das grandes superfícies, alertando para os efeitos negativos na vida pessoal e familiar dos trabalhadores. “As grandes superfícies esvaziaram o centro das cidades e das vilas. Muitas das pequenas lojas não sobreviveram à sua abertura”, afirmou, apelando à responsabilidade social do Parlamento.
Alfredo Maia, deputado do PCP, defendeu que o direito ao descanso aos domingos e feriados é “justo, necessário, imprescindível e possível”, salientando que vários países europeus, como o Luxemburgo e a Noruega, já implementaram restrições semelhantes.
Do lado do PAN, a deputada Inês Sousa Real reconheceu a importância do debate, referindo que está “mais do que na altura” de rever os horários do comércio para garantir o direito ao lazer, descanso e vida familiar. No entanto, o partido não assumiu uma posição definitiva.
As críticas mais duras vieram de partidos como o Chega, PSD e CDS. Felicidade Vital (Chega) acusou os proponentes de seguirem uma “agenda ideológica” e afirmou que o partido está disponível para soluções técnicas e equilibradas, mas não para “transformar o parlamento num palco de ideologias”.
Paulo Núncio (CDS) alertou que a aprovação da proposta poderia ter “efeitos desastrosos” na economia, implicando a destruição de milhares de empregos. “Não se promovem os direitos dos trabalhadores destruindo postos de trabalho”, defendeu.
Do lado do PSD, Ricardo Araújo reconheceu a importância da conciliação entre trabalho e vida familiar, mas rejeitou soluções “rígidas e punitivas”, defendendo modelos mais flexíveis que não prejudiquem a competitividade económica.
O PS também se posicionou contra, com o deputado Hugo Costa a valorizar os mecanismos de contratação coletiva como melhor forma de regulação dos horários laborais. Sublinhou que há trabalhadores que preferem horários rotativos e ao fim de semana, por motivos pessoais ou financeiros.
Carlos Guimarães Pinto, da IL, apontou incoerências na proposta do BE, destacando a exclusão dos cinemas e da restauração, e sublinhou que cada trabalhador tem “circunstâncias únicas”.
Por sua vez, Isabel Mendes Lopes (Livre) reconheceu a relevância da discussão, referindo que “muitas pessoas vão ao supermercado ao domingo porque trabalham seis dias por semana”, mas defendeu que a reorganização dos horários de trabalho deve ser levada a sério.
No encerramento do debate, Mariana Mortágua acusou os partidos que se opõem à proposta de incoerência: “Defendem muito os trabalhadores e as famílias, mas temos pena. Ainda tentam convencer os cidadãos de que rejeitam a proposta pelo seu bem. Senhores deputados, trabalhem ao domingo e por turnos para verem”, afirmou.
A votação final das propostas decorrerá esta sexta-feira, mas tudo indica que as iniciativas não terão viabilidade parlamentar.