Diretor de Oftalmologia demite-se dias antes de revelação sobre contratos milionários com Hospital de Braga

Fernando Vaz terá celebrado contratos de 27 milhões de euros entre o hospital público e a sua empresa privada, Iberoftal. IGAS e Ordem dos Médicos já pediram esclarecimentos.

Fernando Vaz, diretor do Serviço de Oftalmologia do Hospital de Braga, apresentou a sua demissão dois dias antes da divulgação pública de contratos no valor de 27 milhões de euros entre aquela unidade hospitalar e a Iberoftal, empresa de que é proprietário. A informação foi confirmada esta quinta-feira pela Unidade Local de Saúde de Braga (ULSB), que está agora a investigar o caso internamente.

De acordo com o comunicado enviado à agência Lusa, a carta de renúncia de Fernando Vaz tem data de 27 de junho de 2025 e foi recebida pelo conselho de administração da ULSB na terça-feira seguinte. Dois dias depois, a CNN noticiou que, ao longo de 15 anos, o Hospital de Braga celebrou contratos milionários com a Iberoftal — empresa ligada ao próprio diretor do serviço clínico em causa.

A administração da ULSB reconhece que pode haver uma eventual situação de incompatibilidade ou conflito de interesses, e garantiu estar a analisar o caso internamente. Esta relação contratual teve origem durante o período de parceria público-privada (PPP) do hospital e prolongou-se após a transição para Entidade Pública Empresarial (EPE), em setembro de 2019.

Entre 2019 e 2023, os contratos com a Iberoftal representaram mais de 18,1 milhões de euros. Em 2024, foi lançado um concurso público internacional para a prestação de serviços de oftalmologia, entretanto visado pelo Tribunal de Contas. Contudo, enquanto decorriam os trâmites do concurso, foi celebrado um ajuste direto de 743 mil euros para garantir a continuidade dos serviços.

Já em 2025, e na ausência de autorização formal para um novo contrato de três anos (2025-2027), a administração da ULSB recorreu a dois ajustes diretos adicionais, totalizando 5,1 milhões de euros, com a única entidade que apresentou proposta ao concurso: a própria Iberoftal. Estes contratos também obtiveram visto prévio do Tribunal de Contas.

Paralelamente, surgiram denúncias de que médicos internos do Hospital de Braga estariam a ser utilizados em atividades clínicas prestadas pela Iberoftal. A administração garante não ter, até ao momento, conhecimento formal de tais práticas, mas afirma que qualquer indício será alvo de apuramento rigoroso.

A Ordem dos Médicos já pediu esclarecimentos à ULSB sobre a alegada acumulação de funções públicas e privadas por parte de Fernando Vaz, o que poderá violar normas legais e deontológicas. A ULSB anunciou ainda que irá abrir, nos próximos dias, um procedimento para acolhimento de manifestações de interesse para a nova direção do Serviço de Oftalmologia, procurando garantir estabilidade e qualidade na governação clínica da instituição.

O caso, que já levou à abertura de uma investigação pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), poderá ter consequências tanto disciplinares como judiciais, caso se confirmem as suspeitas de conflito de interesses ou má gestão de fundos públicos.