O constitucionalista Paulo Otelo, alertou esta terça-feira que com o fim do estado de emergência, o Governo deixa de ter determinados poderes, nomeadamente, o de multar quem não usar máscara na via pública.
Em declarações à ‘Rádio Observador’, o responsável indica que a cessação deste regime de exceção “levanta alguns problemas constitucionais”, tal como aconteceu no ano passado. “A grande diferença entre o estado de emergência e a situação de calamidade é o que o primeiro é uma figura prevista na própria constituição, o que aqui está em causa é a suspensão parcial de certas normas constitucionais de direitos fundamentais”, explica.
“Pelo contrário, em situação de calamidade, o que está em causa é o exercício da função administrativa”, acrescenta sublinhando que “são situações de estado de necessidade administrativa e não constitucional. E por isso não é possível suspender direitos fundamentais em situações de calamidade”, adianta o responsável.
Uma outra diferença, explica, prende-se com o facto de que na situação de calamidade, ao contrário do que acontece no estado de emergência, “a intervenção é exclusiva do Governo, através de resolução de Conselho de Ministros, o que significa uma marginalização, quer do Presidente da República, quer do Parlamento, uma menor legitimidade política e um menor controlo politico-democrático”.
Desta forma, Paulo Otero refere que “a situação de calamidade permite limites à circulação de pessoas, mas está pensada para situações geograficamente circunscritas”, o que não acontece com a pandemia de Covid-19, que é “um fenómeno global”.
“Por outro lado, a situação e calamidade não permite a suspensão de direitos fundamentais”, adianta explicando que “todas as medidas têm de respeitar os direitos, liberdades e garantias nos termos da constituição”. Assim, o Governo não pode impor o recolher obrigatório, nem estabelecer limite de ajuntamentos, ou obrigar ao uso de máscara na via pública, concretiza.
O especialista defende que a Assembleia da República “poderia ter feito uma lei de emergência sanitária, que acautelasse esta situação continuada para casos pontuais” e lembra os “mecanismos sancionatórios” que não se podem aplicar neste caso.
“O crime de desobediência vai deixar de estar previsto nesta situação, até porque uma resolução de Conselho de Ministros, não pode alargar a figura do crime de desobediência”, o que significa em termos práticos, que “o Governo não vai poder multar quem não usa máscara”, por exemplo.