O advogado que representa a acusação no julgamento que pode custar ao ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro os seus direitos políticos, disse hoje que deve ser considerado culpado de crimes eleitorais e de tentativa de golpe de Estado.

“Ataques sistémicos à democracia, principalmente aos ministros. Que cena triste da nossa história. A esta Corte e ao STF [Supremo Tribunal Federal]. Tentativa nítida de golpe militar, de golpe de Estado”, afirmou o advogado Walber Agra, no plenário do Tribunal Superior Eleitoral.

Agra, em nome do Partido Democrático Trabalhista, autor da ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), argumentou na primeira audiência que o ex-presidente “atacou sistematicamente” tanto o tribunal como a própria democracia.

“Por que foi que cegámos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que veem, Cegos que, vendo, não veem”, disse o advogado, citando a obra “Ensaio Sobre a Cegueira”, de José Saramago.

“Será que vamos entrar novamente em estágio de cegueira coletiva? Como não há facto? Houve uma reunião com claro desvio de finalidade para desmoralizar as instituições e de forma internacional, o que é grave. Utilizou-se bens públicos para finalidades eleitorais e várias vezes”, declarou Walber Agra.

A ação, corroborada pelo Ministério Público Eleitoral, argumenta que Bolsonaro cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação durante uma reunião que o então chefe de Estado brasileiro organizou, em plena campanha eleitoral, com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada, casa oficial do Presidente em Brasília, em 18 de julho de 2022.

Nesta reunião, o então Presidente lançou vários ataques infundados sobre a fiabilidade do processo eleitoral e, mais precisamente, das urnas eletrónicas, utilizadas desde 1996 e validadas por vários organismos internacionais, e que o elegeram para vários mandatos enquanto deputado federal e para Presidente.

Bolsonaro, perante cerca de 40 embaixadores, incluindo o português, disse, sem fundamentos, que o sistema poderia ser alvo de fraude e não seria auditável, insinuou que era uma empresa a contar os votos e não o TSE e afirmou ainda, sem quaisquer provas, que um ‘hacker’ tinha tido acesso “a tudo dentro do TSE”.

Na opinião de Walber Agra “desviou-se propaganda institucional para difundir ‘fake news'”, numa “tentativa nítida de golpe de Estado”, além de ter envergonhado “o corpo diplomático brasileiro”.

O julgamento teve início num ambiente calmo e à entrada não havia manifestações nem contra, nem a favor, do ex-chefe de Estado.

Sete juízes que compõem o TSE, presidido por Alexandre de Moraes, considerado “inimigo número um” de Jair Bolsonaro, começaram a decidir, num julgamento começou às 09h30 locais (13h30 em Lisboa), pela manutenção dos direitos políticos, inelegibilidade, ou adiar a decisão.

A expectativa é de que a decisão não seja tomada hoje.

O tribunal poderá prosseguir com o julgamento nas sessões subsequentes de 27 e 29 de junho.

No caso de algum dos sete juízes solicitar vista do processo “deverá devolver os autos para retomada do julgamento no prazo de 30 dias, renováveis por mais 30, contado da data da sessão em que o pedido de vista foi formulado”, explica o TSE.