Investigação europeia alerta para crise habitacional que afeta de forma severa as populações migrantes, incluindo em Portugal, onde a pressão do mercado e falta de habitação social agravam o problema.
Apenas 50% dos refugiados e migrantes vivem em condições habitacionais consideradas dignas, revela um estudo divulgado pelo ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, no âmbito do Projeto H:OUSE, que decorre em seis países europeus: Portugal, Itália, Grécia, Irlanda, Eslovénia e Hungria.
A investigação, realizada com o apoio do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-Iscte), destaca que a crise da habitação na Europa está a penalizar especialmente os migrantes, que enfrentam discriminação estrutural, obstáculos burocráticos e acesso limitado à informação para conseguir uma habitação estável e segura.
Portugal: cenário agravado por pressão imobiliária e falta de habitação social
Em Portugal, o problema é acentuado pela escassez de habitação social — que representa apenas 2% do parque habitacional nacional — e pela volatilidade do mercado de arrendamento, cada vez mais inacessível. Segundo o estudo, esta realidade está fortemente influenciada por políticas económicas que atraem investimento estrangeiro, como o programa dos Vistos Gold e benefícios fiscais que fomentaram a especulação imobiliária e a gentrificação, sobretudo em cidades como Lisboa e Porto.
A combinação de aumento da procura, escassez da oferta, e alinhamento dos preços com padrões internacionais, apesar dos baixos salários nacionais, cria um cenário de grave inacessibilidade à habitação.
Migração e exclusão habitacional
A população migrante — concentrada maioritariamente na Área Metropolitana de Lisboa — é das mais afetadas. De acordo com os dados do estudo, mais de 40% do rendimento dos migrantes é gasto em habitação, um valor superior ao da média da população portuguesa.
Além da pressão financeira, os migrantes enfrentam barreiras ao crédito, discriminação no arrendamento, xenofobia e respostas ineficazes por parte das entidades públicas. Fenómenos como sobrelotação, subarrendamento e falta de apoio jurídico e social são recorrentes.
Projetos-piloto mostram alternativas viáveis
Apesar das dificuldades, o estudo destaca iniciativas positivas em curso. Em Portugal, o Projeto Reconstruir, em Tadim (Braga), está a construir seis casas para acolher famílias migrantes e refugiadas, e o Projeto LAR, perto da Guarda, reabilitou quatro casas devolutas com o apoio da comunidade local.
O modelo de patrocínio comunitário, promovido pelo Projeto H:OUSE, surge como uma resposta inovadora, envolvendo cidadãos, empresas e organizações no apoio direto a migrantes, garantindo alojamento e integração por pelo menos dois anos.
Conclusão
O estudo apela à implementação de políticas públicas inclusivas e eficazes, com foco no direito à habitação consagrado na Constituição, para travar uma exclusão habitacional que afeta de forma desproporcionada os migrantes e refugiados. Numa Europa onde o discurso sobre integração continua a ganhar espaço, o acesso à habitação é um dos pilares fundamentais para garantir dignidade, segurança e inclusão.