A rivalidade entre Vitória e Braga: a culpa é de D. Henrique

Pois é. Tem séculos este ódio de estimação entre Guimarães e Braga. Bem se pode dizer que é anterior à fundação de Portugal; começou por ser uma batalha religiosa e hoje é o que se sabe.

A rivalidade entre o V. Guimarães e o Braga que hoje aquece o nosso futebol tem uma origem longínqua, quando os ingleses ainda estavam longe de inventar este jogo tão apaixonante que é o futebol. Na realidade, bem podemos usar a expressão popular e dizer que esta rivalidade é mais velha do que a Sé de Braga, porque o é realmente. Ainda a mais velha Sé estava em obras e já as duas cidades estavam em conflito. Começou tudo por ser uma luta religiosa, que muito mais tarde se estendeu à política (hoje, as duas cidades pertencem a regiões de turismo diferentes, por exemplo) e, mais recentemente, ao futebol. É secular. D. Henrique, que fundou o Condado Portucalense, foi quem, inocentemente, abriu esta guerra eterna. O pai de D. Afonso Henriques estabeleceu-se em Guimarães e começou a beneficiar os locais com direitos vários, para grande contrariedade e irritação do arcebispo de Braga, D. Estêvão Soares. Segundo Miguel Bandeira, geógrafo, a Carta do Condado delimitava o couto de Braga, separando desde cedo o senhorio eclesiástico (com justiça e impostos próprios) do condal. “Era um Vaticano, uma cidade-estado.” O arcebispo de Braga queixou-se ao Papa Inocêncio III por causa das regalias que tinham sido concedidas ao cabido de Guimarães. A Concordata de 1216 vexava os vimaranenses, que, danados, queimaram celeiros, pomares e matas. Foram por isso excomungados.

A rivalidade, pode-se dizer, está-lhes no sangue. Claro que para muitos habitantes das duas cidades, esta história não está presente quando se fala das rivalidades; os tempos evoluíram e a rivalidade passou para outros sectores da vida, como a política ou, como não podia deixar de ser, o futebol. Há jogos entre os dois que acabaram muito mal e estes dérbis, como o que se vai jogar depois de amanhã, são sempre alvo de uma segurança apertada, que não impede, contudo, as provocações e, às vezes, os tumultos. Também nunca foram vistas com bons olhos pelos adeptos as aproximações entre as Direções dos dois clubes: quem é braguista não tolera essa paz, quem é vimaranense não gosta de as ver aos sorrisos.

É assim entre espanhóis (os de Guimarães) e marroquinos (os de Braga). Há quem garanta que estes batismos vêm de há muitos e muitos anos, mas também há quem afirme que tudo nasceu na sequência de um jogo de futebol em 1976, em Guimarães. Jogava-se o apuramento para uma competição europeia, o V. Guimarães “foi roubado” e perdeu. A coisa ficou feia e os adeptos vimaranenses queimaram o carro do árbitro (António Garrido). Na semana seguinte, o V. Guimarães defrontou o Boavista no Estádio das Antas, na final da Taça de Portugal (uma das cinco que foram jogadas fora do Jamor). Os adeptos vimaranenses exibiram uma tarja onde se lia: “Para sermos tratados assim, é melhor irmos jogar para Espanha”. Os braguistas aproveitaram a deixa e passaram a chamar espanhóis aos vizinhos e rivais, que trataram logo de contra-atacar, batizando-os de marroquinos. Nas conversas de café, entre amigos, é assim que se referem uns aos outros: espanhóis e marroquinos. São nomes que entram também nas batalhas de provocações, transferidas nos nossos dias dos cafés para as redes sociais, onde é fértil a troca de insultos.

Há, no entanto, algo que une os adeptos de V. Guimarães e Braga: o amor fervoroso aos respetivos clubes. Nisso, nenhum pode dizer que é melhor do que o outro…