Telemóveis ao volante dão 115 multas por dia

Dados das forças policiais indicam que, este ano, estão a ser passadas, em média, 115 multas por dia, mais do que no ano passado. Aumento da distração digital preocupa autoridades.

Os portugueses continuam a usar o telemóvel enquanto conduzem e a comprová-lo está o aumento das multas. Em média, foram passadas 115,5 multas por dia até setembro. O número já ultrapassou o das contraordenações diárias por uso do telemóvel ao volante em 2017 (114,1), o que indica que, no final do ano, o total de multas poderá ser superior ao do ano passado, ainda que aquém das 158 multas/dia em 2016. Acresce que os fatores de distração estão a aumentar: com os novos ecrãs digitais, há até quem veja televisão enquanto conduz.

Entre 1 de janeiro e 15 de setembro deste ano, a GNR multou 16 640 condutores pelo uso de telemóveis ao volante. Já a PSP, até 31 de agosto, tinha aplicado 12 427 contraordenações. No balanço das duas forças policiais, foram passadas, em média, 115,5 multas/dia. No entanto, a utilização destes dispositivos durante a condução já não é a única preocupação das autoridades e especialistas em matéria de distração dos condutores.

Às chamadas telefónicas e envio de SMS ao volante, tudo feito através do telemóvel, juntam-se os dispositivos GPS, tablets e smartphones (com estas e novas funções) e os painéis de controlo dos automóveis mais recentes que têm um ecrã digital. Há quem veja vídeos ou até televisão durante os percursos.

Jorge Jacob, presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), não esconde a preocupação com esta tendência. “Quando as pessoas tiram a vista da estrada, é um problema”, adiantou ao JN, revelando que a distração digital ao volante “já é” encarada como mais um desafio pelas autoridades. “Nalguns casos, o próprio comando do veículo é feito através de um ecrã digital. Como é que se vai combater isso? É mais complicado”, frisou.

São cada vez mais os estudos internacionais a dizer que a utilização de aparelhos digitais tem um impacto quase tão alto nos acidentes como o excesso de velocidade e o consumo de álcool.

“Hoje, a maioria dos veículos tem qualquer coisa que nos distrai para além do telefone”, sublinhou, por seu lado, João Queiroz, da Associação Estrada Mais Segura. Segundo o especialista em segurança rodoviária, mesmo um condutor com capacidade “de resposta ao risco” acima da média, ao desempenhar duas funções – conduzir e utilizar um telemóvel – “vai perder a capacidade de ler o ambiente” em que está e de “reagir aos perigos que enfrenta”.

“Ao contrário do que as pessoas pensam, ter um veículo na mão é ter um perigo, porque não estamos sozinhos. Os peões, os ciclistas, todo o ambiente rodoviário podem ter imprevistos para os quais os nossos sentidos têm que estar despertos. Porque, mesmo quando estão, muitas vezes não conseguimos evitar um acidente”, frisou.

LEGISLAR PARA PREVENIR

No início do ano, o secretário de Estado da Proteção Civil, José Artur Neves, revelou que o Governo estava a ponderar a inibição do sinal de telemóvel dos condutores. Mas, desde então, não se avançou neste caminho e a verdade é que a aplicação desta medida levanta questões técnicas e operacionais.

“Não se resolve o problema do “touchscreen” (ecrã tátil) bloqueando os telemóveis todos”, sublinhou Jorge Jacob. O dirigente da ANSR defendeu um “reforço de medidas de combate à sinistralidade”, através da criação de mais legislação, sem identificar as áreas onde se deve intervir.

“Quando a sociedade começou a perceber que tinha um problema em mãos, deu-se conta de que era extremamente difícil impedir uma coisa que se tinha generalizado”, rematou João Queiroz.

O Plano Estratégico Nacional de Segurança Rodoviária (PENSE 2020) engloba várias medidas relacionadas com o uso de telemóveis e outros aparelhos digitais. Uma delas tem a ver com o estudo da possibilidade de se regulamentar a deteção do uso de telemóvel por condutores envolvidos em acidentes. As causas dos acidentes também serão investigados por equipas multidisciplinares e será avaliada a possibilidade de recolher evidências sobre o uso de telemóvel por condutores e peões envolvidos em acidentes com vítimas, pelas forças de segurança.