Mais de 67 mil estão à espera depois do tempo máximo. Lista de inscritos em níveis “historicamente baixos” por causa da pandemia.

São números “historicamente baixos”. Em outubro do ano passado estavam inscritos para cirurgia 209 mil utentes. E, mesmo assim, de mês para mês, não pára de aumentar o número dos que estão à espera fora dos prazos recomendados. Em outubro, eram mais de 67 mil, quase um terço do total.

As duas situações têm na pandemia a resposta. Analisando a Lista de Inscritos para Cirurgia (dados do Portal da Transparência do SNS), há cerca de quatro anos que não se verificava um valor tão baixo como o agora registado: 209 385 inscritos. Pela simples razão que os hospitais não estão a receber doentes referenciados pelos Cuidados de Saúde Primários (CSP), absorvidos pela covid-19.

“O que acontece hoje, além desta terceira vaga, é que os CSP estão paralisados, sendo urgente reabilitá-los”, diz ao JN o presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada, Alexandre Lourenço. Há meses, recorde-se, que a Ordem dos Médicos vem apelando para que se libertem os médicos de família dos contactos telefónicos diários a doentes covid-19 para que, assim, possam acompanhar os seus doentes.

Paralisação essa, recorda Alexandre Lourenço, que tirou aos centros de saúde perto de “dez milhões de contactos presenciais”, dos quais dois terços referentes a consultas e o restante a atos de enfermagem. “Não estão a ser diagnosticadas patologias que seriam depois referenciadas para os hospitais para plano terapêutico, incluindo cirurgia”, sublinha.

Recursos não esticam

Com a pandemia, depois, a impactar na atividade programada dos hospitais. E aqui está a explicação para, apesar de “números historicamente baixos de inscritos”, estar a aumentar o incumprimento dos tempos máximos de resposta garantidos (TMRG – ver ficha). Se, em janeiro de 2019, 20,5% dos inscritos estavam fora do TMRG, em outubro chegava já aos 32,1% (67 121).

“Os recursos não são elásticos e foram redimensionados para a covid. O que teve efeitos nos atrasos da atividade cirúrgica, além de que tudo se hoje se faz mais lentamente: proteções individuais, circuitos alterados, testes aos utentes”. Mas “podia ter sido mitigado com um plano efetivo de resposta aos doentes não covid”. Isso mesmo tinha defendido, aliás, juntamente com o bastonário Miguel Guimarães, na Comissão Saúde, quando ouvidos em nome do Movimento Saúde em Dia.

Operacionalização em rede que pressupõe, primeiro, definir “áreas prioritárias, estabelecendo uma via verde para a oncologia, para a diabetes”. Mas em rede, “para se responder de forma mais adequada”. E, depois, definir hospitais. “Os hospitais tentam responder a tudo, mas sem articulação, e com a terceira vaga, os doentes não covid vão ser altamente penalizados”. A Ordem reitera a necessidade de criar hospitais exclusivos para doentes covid-19.

Incentivos e contratação ao setor social

O Ministério da Saúde criou um sistema excecional de incentivos, em julho, para recuperar a atividade programada não realizada ou adiada. Por outro lado, Administrações Regionais de Saúde como a do Norte prolongaram contratos com o setor social para a realização de milhares de consultas e de cirurgias. Em Lisboa, por exemplo, há cirurgiões de hospitais públicos a operarem doentes do SNS em unidades privadas.

in “jn”