Empresas diversificam soluções para fazer face à falta de carros novos. Prolongamento da vigência dos contratos por mais um ano, novos contratos de renting de usados e compra de marcas e veículos alternativos são algumas das medidas do setor.

Com a falta de veículos novos para entrega imediata, o negócio das gestoras de frotas está a sofrer uma mudança de paradigma, obrigando a novas soluções, até aqui pouco habituais, para fazer face às necessidades do mercado. “As gestoras de frotas estão a prolongar constantemente os prazos com os seus clientes, porque não têm carros novos para substituição, por isso, propõem renovar por mais um ano. E, nalguns casos, estão a utilizar uma nova figura: um novo contrato de renting [aluguer de veículos de longa duração] sobre carros com idade até três anos, chegando até a fazer dois ou três contratos com o mesmo automóvel”, revela ao Dinheiro Vivo, Roberto Gaspar, secretário-geral da Associação Nacional das Empresas do Comércio e da Reparação Automóvel (ANECRA).

O responsável adianta que este tipo de contratos de usados eram pouco habituais antes da escassez de carros novos e que eram as gestoras de frotas que alimentavam o negócio da venda dos seminovos, fornecendo os retalhistas, que, face à falta de oferta, não estão a ter produto nesta faixa de idades para revenda.

Roberto Gaspar afirma que as gestoras de frotas estão a ter mais dificuldades em negociar contratos de aquisição vantajosos com os fabricantes. “É a lei do mercado a funcionar: quando havia muita oferta, estes operadores tinham mais poder negocial, porque compravam em quantidade e conseguiam assim bons descontos. Agora, que há mais procura, são os fabricantes que ditam as regras. Há casos de algumas marcas que cancelam encomendas das gestoras de frotas, que, se quiserem fazer um novo contrato, pagam preços mais elevados”, explica.

A situação prejudica a normal previsibilidade do negócio. Tem havido dificuldades por parte dos construtores automóveis em satisfazer as necessidades de mercado, uma situação que teve origem no período inicial da pandemia, devido aos constrangimentos impostos, levando, sobretudo, à falta de semicondutores, necessários para a produção de veículos automóveis.

Contactada a associação que representa o setor do renting, a ALF – Associação do Leasing, Factoring e Renting, Luís Augusto, presidente, confirma que “as empresas têm encontrado no prolongamento da vigência dos contratos uma solução de mobilidade para os seus clientes, apesar de esta medida tender a repercutir-se num agravamento de custos para as empresas de renting, devido à manutenção das viaturas em circulação”. Acrescenta que o prolongamento permite manter a mobilidade automóvel enquanto não se alcança uma solução definitiva.

“Para encontrar soluções para a substituição do automóvel, também têm sido propostas marcas e modelos alternativos, nomeadamente de veículos elétricos. Esta adaptação às novas condições do mercado significa um esforço acrescido, mas o resultado verificado, com um parque circulante já superior ao de 2019, valida as estratégias adotadas”, explica o responsável. Relativamente às negociações de contratos, diz apenas que isso é algo que diz respeito ao mercado e a cada operador, admitindo, no entanto, ser evidente que os preços têm aumentado de forma generalizada. “As empresas de renting têm apresentado grande flexibilidade para encontrar novas soluções para os clientes. Contudo, há repercussões do aumento dos preços dos automóveis não passíveis de serem absorvidas pelo setor”, afirma ainda.

Soluções para combater dificuldades
Pedro Coutinho, da Kinto Portugal (anterior Finlog), confirma que, “efetivamente, há alguns casos de cancelamentos (menos) e de alteração de preços (mais frequente) após as encomendas. Estamos num contexto novo, muito difícil, também para os fabricantes”. Admite que estas são situações que não ajudam na relação com os clientes e que, a médio prazo, poderão ter consequências indesejadas. “Na Kinto, temos a preocupação de alertar antecipadamente para este risco. Vivemos numa grande imprevisibilidade e procuramos soluções que permitam os nossos clientes manter a sua atividade. No entanto, há alterações de condições, como o aumento de preços dos veículos, por exemplo, que não dependem de nós, e que temos de transmitir ao cliente”, explica o diretor comercial. Já a preparar-se para os desafios futuros, a empresa lançou dois produtos, o Kinto Flex e o Kinto Share, e a solução de partilha de viaturas, a Kinto Join, que incentiva a utilização das viaturas de forma mais inteligente e sustentável, explica.

Também Ricardo Silva, diretor comercial da LaesePlan em Portugal, assume que, “há casos de fabricantes a não conseguir entregar automóveis já encomendados, embora o que suceda, sobretudo, é o adiamento do prazo de entrega dessas encomendas”. Para minimizar os efeitos destes adiamentos, a empresa tomou várias medidas, que considera estarem a surtir efeito, já que, segundo Ricardo Silva, “o ano de 2021 foi especialmente gratificante para a LeasePlan, uma vez que alcançámos um marco histórico, atingindo os 60 mil veículos em renting“. Uma das medidas passa por dar a conhecer aos clientes que os prazos de entrega de carros novos, antes nos dois ou três meses, poderão ir agora até aos 12 meses, recomendando que faça a encomenda com essa antecedência e, por outro lado, facilita o prolongamento do contrato atual. “Visto a escassez de carros novos, disponibilizamos também um produto inovador criado pela LeasePlan, que é o renting de automóveis usados”, remata Ricardo Silva.

Segundo a ALF, apesar das dificuldades sentidas, a atividade está a crescer e, até maio de 2022, as suas associadas conseguiram superar os valores do parque circulante relativamente a 2019, passando os 123 mil veículos. “Além disto, entregámos 11 500 veículos novos aos clientes, valor correspondente a 16,5% dos veículos vendidos em Portugal no mesmo período de janeiro a maio deste ano”, remata Luís Augusto.