Na abertura do 42º Congresso Português de Cardiologia, o cardeal José Tolentino de Mendonça falou sobre a capacidade encontrar a felicidade e evitar a desolação, mesmo em tempos de pandemia.

eliz é aquela ou aquele que faz do coração dos outros o seu próprio coração”. As palavras, proferidas pelo cardeal José Tolentino de Mendonça, inauguraram, esta sexta-feira, o 42º Congresso Português de Cardiologia, a decorrer digitalmente até dia 2 de maio. Perante uma plateia digital de médicos cardiologistas e outros profissionais de saúde, o teólogo, professor universitário, ensaísta e poeta falou de caminhos de felicidade no mundo contemporâneo e deixou cinco pistas para nos guiar nessas mesmas estradas.

Num ano em que a pandemia obrigou a “adaptar, manter o ritmo e a proximidade possível”, Regina Ribeiras, presidente do Congresso Português de Cardiologia 2021, justificou a escolha do cardeal, sublinhando a importância que o cuidado e a responsabilização pelo outro têm no âmbito médico, para lá da partilha de evidência científica.

É certo que, nos tempos que correm, em que a batalha pela sobrevivência sobrepõe-se, por vezes, à necessidade de viver, “pode parecer um luxo insensato esbanjar tempo a pensar a felicidade”, comentou Tolentino Mendonça. No entanto, é uma atitude necessária, pois, como relembra o cardeal, a crise sanitária, social e económica que atravessamos corre o risco de se tornar também numa crise da esperança, “se nos deixarmos afundar num pessimismo sem retorno e se a incerteza se sobrepuser à confiança”.

Mencionado 1700 vezes nos textos bíblicos, 80% das quais como metáfora humana, o coração é a expressão poética de uma felicidade que, segundo Tolentino de Mendonça, tem de ser reconhecida, mais do que procurada, para que possamos descobrir a vida enquanto experiência verdadeira e completa.

É que, até agora, estávamos habituados a ver o conflito e o sofrimento mediado por ecrãs. A quilómetros de distância, a morte e as lágrimas dos outros doem menos do que nos corredores das nossas casas e hospitais. “Não é fácil constatar, repentinamente, que sabemos menos de nós próprios e da vida do que pensávamos”, afirmou o cardeal, alertando, no entanto, que “a pandemia não nos deve deixar descrentes da vida, cínicos em relação ao mundo e dissidentes da expetativa que cada um tem em relação à felicidade”.

Cinco passos para a felicidade

Recorrendo à metáfora que tanto lhe é querida, os caminhos, Tolentino Mendonça relembrou que existem cinco tarefas que caracterizam o caminho de aprendizagem necessário à conquista da felicidade: reconciliar-se com a vida, amá-la tal como se apresenta, dar até o que não se tem e agradecer o que não nos dão e ainda cuidar do que nos faz felizes.

“A certa altura, percebemos que o mais importante não é perceber se a vida é bela ou trágica, mas saber se estamos dispostos a amá-la como ela se apresenta”, explicou, frisando a importância da escolha entre o amor ilusório à vida, “que nos faz adiá-la perenemente”, e o amor real, mesmo que ferido, com que a assumimos. Isto é, “condicionar o júbilo pela vida a uma felicidade sonhada é já renunciar a ele”.